Gaiman

Perdi um deadline há pouco tempo. Perdi totalmente. Pela primeira vez em 25 anos suspirei e disse "não consigo fazer isso e não vou entregar a história". Já estava atrasada, eu estava pressionado pelo prazo, meu pai faleceu e de repente a história tinha virado um cadáver na página. Tinha gostado do estilo, mas não estava funcionando, e então, ao invés de deixar os editores malucos esperando uma história que nunca ia chegar, desisti e pedi desculpas, me questionando se conseguiria escrever ficção de novo.

Passei para outro deadline - um roteiro. Fluiu tranqüila e docemente, foi a coisa mais divertida que escrevi em muito tempo, todos os personagens fizeram o que eu queria que fizessem e a história ficou melhor do que eu ousava esperar.

Às vezes isso acontece. Você não escolhe o que vai funcionar. Você apenas faz o melhor que puder a cada vez. E você tenta fazer o que puder para aumentar as chances de que seja criada uma boa obra de arte.

E, às vezes - e isso vale tanto para autores quanto leitores - você tem sua vida. As pessoas do seu mundo adoecem ou morrem. Você se apaixona, ou se separa. Você muda de casa. Sua tia vem passar uns dias. Você aceitou um convite para uma palestra do outro lado do mundo há cinco anos, e de repente percebe que a palestra é amanhã. Seu último livro é lançado e os críticos detestaram e aí você fica sem vontade de escrever outro. Seu gato aprende a levitar e você necessita documentar e investigar o fato imediatamente. Os alces invadiram sua horta. Uma tempestade fritou seu HD e o backup...

E ter uma vida é bom para um escritor. É de lá que você tira sua matéria prima. Gostamos muito de parar e observá-la.

Isso é um trecho de uma resposta do Neil Gaiman a um fã que reclamou que outro escritor - e o próprio Gaiman, por tabela - estava demorando para continuar uma série de livros que ele gostava. Para resumir a velha discussão entre as obrigações do autor para com seus fãs, Gaiman pede até desculpas por ser bem direto: "[O escritor] is not your bitch." (não vale a pena traduzir).

Enfim. É uma das coisas mais inteligentes e divertidas que o Gaiman escreve em anos.

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This page contains a single entry by Érico Assis published on maí 13, 2009 2:22 EH.

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