Estudos de Redes Sociais na Internet


O Akshay Java, do blog Social Media Research fez um post comentando a "triologia" da pesquisa em redes sociais. Eu fiquei inspirada a comentar, já que uma boa parte da minha tese é uma recuperação dos estudos de redes sociais, para desaguar no estudo das redes sociais na Internet. Vou aproveitar e fazer algumas recomendações de leituras a respeito dos assuntos.

A Análise de Redes Sociais

redea.jpgO estudo das redes sociais não nasceu, como o Akshay Java aponta, da triologia Barabási, Watts e Strogatz (daqui a pouco falo sobre eles). Na realidade, há uma longa esteira de estudos a partir dos quais a metáfora das redes foi aplicada para os grupos sociais. A Sociometria, que surge a partir do início do século, com os trabalhos do Jacob Moreno, por exemplo, é baseada na Teoria dos Grafos, que deu origem a boa parte das abordagens de redes em várias ciências. A Sociometria é um dos braços que auxilia na construção do chamado paradigma da Análise de Redes Sociais. A ARS é um conjunto de métodos de estudo dos grupos sociais como redes, mas que continua, inicialmente, um forte viés empírico e uma tentativa de medir as relações, laços e interações sociais, como componentes da estrutura social. Assim, a ARS é uma forma matemática de análise sistemática de grupos sociais. Quem trabalha com a ARS, por exemplo, trabalha com elementos como sociogramas, graus de centralidade dos grafos (Degree Centrality, Betweenness Centrality, e Closeness Centrality), centralização e etc.

Para saber mais sobre a ARS

analysisn.jpg #Site da International Association for Social Network Analysis (ISNA). Além de uma extensa bibliografia, tem várias definições a respeito do que é e do que não é Análise de Redes Sociais.

# Compêndio de métodos, dados e definições a respeito da ARS do Robert A. Hanneman e do Mark Riddle. É bom para quem quer conhecer como tratar os dados e como usar os softwares.

# Outro compêndio de introdução à ARS. Especialmente bom nos chamados fundamentos matemáticos.

# Livros legais para compreender a ARS:
Models and Methods in Social Network Analysis (Peter J. Carrington)
The Development of Social Network Analysis: A Study in the Sociology of Science (Linton Freeman, um dos pais da ARS)
Social Network Analysis: Methods and Applications (Structural Analysis in the Social Sciences) (Stanley Wasserman e Katherine Faust, um dos meus primeiros contatos com a ARS, bastante recomendado)
Introducing Social Networks (Alan Degenne e Michel Forsé)
Social Network Analysis: A Handbook (John Scott)


O estudo das redes sociais na Internet, no entanto, quase não era abarcado pela ARS. A partir do início da década de 90 e final de 80, os trabalhos do sociólogo Barry Wellman é que começam a vir nessa área. Ele tem uma larga história dentro da ARS (vide, por exemplo, seus artigos sobre métodos de análise de redes sociais e sobre Teoria de Redes Sociais. O Wellman não só é um dos primeiros a focar no estudo das redes sociais na Internet, como também abarca uma perspectiva menos quantitativa nesta discussão. Ele também já utiliza conceitos como o de capital social como fundamentais para a definição da estrutura social. (Atenção: Wellman defende firmemente o estudo das redes sociais como fundamentalmente empírico e sistemático baseado nos preceiros da ARS. Para esta perspectiva, não há análise de redes sociais em trabalhos meramente reflexivos. O estudo das redes sociais é firmemente fundado na análise sistemática de larga quantidade de dados obtidos em campo e do que os dados mostram, para só depois, permitir a reflexão sobre os dados.)

O Wellman também tem vários livros que introduzem o estudo das redes sociais, principalmente o Social Structures: A Network Approach, o Networks In The Global Village: Life In Contemporary Communities (um dos primeiros a lidar com a Internet enquanto espaço da rede social) e o The Internet in Everyday Life, com a Caroline Haythornthwaite.

Outro nome importante nesta perspectiva é o Mark Granovetter. Ele trabalho com o espalhamento de informações dentro das redes sociais e é o nome que criou o conceito dos laços "fortes" e "fracos". Ele escreveu um famoso artigo na década de 70, denominado The Strengh of Weak Ties (que depois foi revisitado), além dos livros Getting a Job: A Study of Contacts and Careers e The Sociology of Economic Life (mais do ponto de vista econômico do seu trabalho).

Em resumo:

A Análise de Redes Sociais é uma perspectiva de fundamento empírico e sistemático, que compreende o estudo da estrutura e da composição dos grupos sociais e trabalha com os conceitos de laços e capital social e com as medidas de rede.

A "Nova" Teoria das Redes

redeb.jpg A partir da década de 90, com o advento da Internet, os estudos das redes sociais foram "redescobertos" por um grupo de estudiosos de viés matemático e físico. Nesta leva estão o Duncan Watts, o Albert-László Barabási, o Steven Strogatz (que foi o orientador do Watts) e o Mark Newman. Esses estudiosos vieram de grupos que procuravam entender não mais a composição e estrutura das redes sociais, mas fundamentalmente, a dinâmica das redes sociais no tempo.

# O Barabási escreveu o famoso Linked: How Everything Is Connected to Everything Else and What It Means. Ele foi o primeiro a identificar, nas redes em geral, os conceitos de redes sem escalas e da conexão preferencial. Basicamente, o Barabási identificou que, nas redes sem escala há sempre a presença de conectores, ou seja, nós extremamente conectados, que contribuem para reduzir a distância média entre cada nó. Basicamente, dando um exemplo social, pensem em uma pessoa extremamente popular, que conhece muito mais gente que a média dos seus amigos: esse cara é um conector. Ou seja, através dele, você (e seus amigos) estão mais conectados no tecido social. Além disso, como o cara é super popular, há uma tendência lógica que, digamos, um novo membro do grupo venha a conhecê-lo antes de você (já que ele conhece tanta gente e transita entre tantos grupos). Essa tendência, dos novos nós conectarem-se ao conector, foi identificada pelo Barabási como conexão preferencial e como o modo de evolução da rede.

# O Duncan Watts (que na verdade publicou antes do Barabási) trabalha principalmente com o fenômeno dos mundos pequenos e da importância dos laços fracos na estrutura social (bastante baseado no Granovetter, portanto). Ele escreveu o Six Degrees,/a>, que é mais geral, um livro bastante voltado para teorias sociais, e o Small Worlds: The Dynamics of Networks between Order and Randomness, onde ele discute que a tendência à formação dos mundos pequenos seria inerente nas redes sociais.

# O Steven Strogatz trabalhou mais a fundo com as estruturas emergentes das redes sociais. Ele escreveu o Sync, mostrando que a sincronia seria uma característica dos grupos sociais e também implicando na emergência da complexidade nos sistemas sociais.

# O Mark Newman tem um trabalho mais focado na estrutura matemática das dinâmicas das redes. Ele é co-autor, com o Barabási e o Watts de um livro que tem todos os textos mais "clássicos" desta abordagem, The Structure and Dynamics of Networks. Apesar de muito interessante, o livro é bastante matemático e pode complicar a vida de quem não está familiarizado com os conceitos básicos da ARS.

# Outro livro que fala sobre essa "nova abordagem" é o Nexus do Mark Buchanan, que revisita todas as teorias e descobertas e tenta elevar a "nova" ciência das redes à categoria de paradigma científico.


Esses estudos que eu mencionei acima deram novo fôlego aos estudos a respeito dos grupos sociais na Internet, da difusão de informação e mesmo das estruturas das redes percebidas em sites, por exemplo. Apesar da maior parte do pessoal que trabalha com os conceitos da "nova teoria das redes" pouco ou nada referir-se à ARS (e vice-versa), há um forte alinhamento das duas perspectivas. Finalmente, outros trabalhos que tocam marginalmente em conceitos relacionados com a estrutura, a composição e/ou a dinâmica das redes, como os estudos dos sistemas complexos, de comportamento de multidão, e mesmo livros de divulgação científica na área - vide o Emergência do Johnson (que é mais divulgação científica), os trabalhos do Johhn Holland (como o Hidden Order e o Emergence, que focam a dinâmica dos sistemas complexos) ; Stuart Kauffman (At Home at the End of the Universe e o The Origins of Order: Self-Organization and Selection in Evolution , focados em auto-organização, evolução e sistemas complexos; ) ou mesmo trabalhos focados em perspectivas dinâmcias de grupos como o The Wisdom of Crowds do James Surowiecki - também costumam ser citados e utilizados pelos pesquisadores da área. Por conta disso, o estudo das redes sociais na Internet cresce como uma perspectiva multidisciplinar, ainda fortemente empírica e sistemática, mas inovadora no que tange à complexidade de sua abordagem.