Recuperando a História do Orkut no Brasil


orkut.jpg Inicialmente, minha tese abrangeria uma larga parcela de dados a respeito do surgimento e do crescimento do Orkut no Brasil. Como esse material acabou sendo cortado, resolvi fazer um post sobre o capítulo. :-) A idéia inicial era comentar o crescimento do Orkut no Brasil e apontar alguns elementos significativos da minha percepção sobre este crescimento que iriam para a tese.

Como todos sabem, o Orkut foi lançado comercialmente pela Google em janeiro de 2004. Lembro especialmente de tomar conhecimento da ferramenta em uma matéria da Wired que comentava, justamente, a necessidade de ser convidado por alguém logo depois do lançamento (apesar disso, nunca mais achei a matéria lá, provavelmente por conta das reformulações que a revista sofreu). Antes disso, seu antecedente foi o Club Nexus (Hampell, 2004), que era o sistema que tinha sido originalmente desenvolvido pelo Orkut Buyukokkten como site de rede social e que era principalmente utilizado pelos alunos de Stanford em 2001, onde ele fazia o doutorado. Ele disse que o Google se interessou pelo projeto e acabou modificando e lançando em 2004 com o nome dele (o que o próprio Orkut não achou muito bom).

Quando eu fui convidada para o Orkut, por um amigo da Unicamp, lá pelos idos de fevereiro de 2004, o site já tinha um número razoável de brasileiros. A maioria eram amigos/colegas da área de informática, mas uma boa quantidade de blogueiros conhecidos e empreendedores de Internet começava a entrar na mesma época. Dentre as iniciativas interessantes dos brasileiros, estava o uso das comunidades para dar personalidade para o perfil, coisa que os americanos, que até então eram a maioria dos usuários, não faziam e a competição pelo número de amigos e de comunidades.

Havia já algumas diferencas básicas do comportamento dos brasileiros e americanos na época. Acho que o pessoal do Brasil foi muito mais influenciado pelo Orkut como uma grande novidade porque o Friendster, que sera o site de rede social mais conhecido por aqui não tinha pego muito bem. E a idéia de trazer os amigos e experimentar era muito forte. Lembro que meus amigos americanos muito raramente usavam o Orkut para conversar ou mesmo para abrir tópicos nas comunidades. Os brasileiros faziam muito mais isso. Outro elemento que inicialmente atraiu muita gente foi a famosa comunidade "Como ou não Como". A idéia da original era oferecer perfis do pessoal para uma "avaliação" dos atributos pelo grupo. Lembro que era uma comunidade absurdamente ativa (chegava a ter centenas de mensagens por dia!) e era uma motivação muito forte para que quem já estivesse no Orkut convidasse os amigos para entrar (colocar os perfis deles na roda). Aliás, foi o próprio crescimento do Orkut que matou a ConC. Com tanta gente entrando, começou a ficar impossível acompanhar as mensagens nos fóruns e várias "sub-comunidades" ConC começaram a surgir. Finalmente, outro elemento que eu sempre achei determinante para a entrada do pessoal no sistema foram as classificações (corações, estrelinhas, cubinhos de gelo e o "top ten" que existia). Todos queriam saber como os amigos os classificavam e assim, era interessante convidá-los. Outra prática comum entre o pessoal do Brasil era "invadir" as comunidades gringas e ficar falando português, exatamente como era na EFnet, na época do IRC.

O Anthony Hempell escreveu um artigo a respeito de uma observação do crescimento das primeiras onze semanas do Orkut e, nele, começou a apontar um crescimento rápido no Brasil, Japão e Índia, especialmente a partir de março de 2004.

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Fonte: Hempell, 2004.

O gráfico acima, que está no paper dele, mostra o momento em que a curva de crescimento começa a aproximar-se de uma power law no Brasil. Nesse paper, o Hempell ainda relembra o emblemático caso do Huy Zing, que foi orkuticidado e depois, revivido; e das dificuldades em lidar com algumas das primeiras ferramentas de controle, como a prisão que era usada para prejudicar desafetos no sistema.

Outros dados sobre o crescimento do Brasil ainda podem ser encontrado em comunidades como a Orkut Statistics. Ali temos dados do crescimento do Brasil a partir de abril de 2004, quando os EUA, pela primeira vez, reduzem sua presença para menos de 50% dos usuários. Na época, em menos de três meses, o Brasil passou de 8o país no ranking do Orkut para primeiro. Com o crescimento do número de brasileiros, muitos estrangeiros passaram a hostilizar o Brasil e a discutir essa "invasão".

Do mesmo modo, enquanto o Brasil crescia, o uso nos Estados Unidos e Japão (os dois primeiros países originalmente) caía bastante. Em meados de maio, o Brasil passou o Japão e tornou-se oficialmente o segundo nas estatísticas do sistema. Finalmente, no dia 23 de junho de 2004, o Brasil bateu os Estados Unidos, tornando-se o país com o maior número de usuários do Orkut.

Muitos creditam o aumento exagerado de usuários brasileiros ao espalhamento do Orkut nas Universidades. Em junho de 2004, por exemplo, algumas das maiores comunidades eram de universidades (UFRGS, USP e Unicamp, respectivamente) e havia uma grande centralização de comunidades representativas do Rio Grande do Sul (que por algum tempo também foi apontado como um dos "centros" brasileiros do Orkut).

Essas considerações são elementos gerais a respeito do crescimento do Orkut no Brasil ainda em 2004. Na verdade, se pegarmos os dados do número de usuários, a power law, nessa época, estava apenas começando. O crescimento vai se manter estável ainda pelos anos de 2004 e 2005. A partir de 2006, o crescimento do Orkut começa a levantar bastante, mas daí menos pelos brasileiros e mais pela entrada de países como a Índia e o Paquistão.

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Fonte: Alexa, gráfico gerado em 2007.


Na verdade, o Brasil ainda é o grande líder em número de usuários do Orkut, mas a Índia começa a ser, cada vez mais, uma ameaça. Não só porque o crescimento estabilizou no País (o Orkut tem quase o mesmo número de perfis que a projeção do número de internautas brasileiros), mas principalmente, porque ainda não se estabilizou por lá (o que explica a queda em números percentuais do Brasil enquanto #1).

Os comentários acima foram construídos com base nos meus dados pessoais da tese e em observações genéricas sobre o sistema que tenho em meu diário de campo. Quem quiser contribuir com sua experiência ou ponto de vista, pode ir colocar nos comentários. :-)