Privacidade e Redes Sociais: Brasil x Índia


privacy.jpgO crescimento da adoção de uma ferramenta de conversação mediada pelo computador e sua aproximação da massa crítica tem efeitos bem consideráveis sobre a apropriação. Quanto mais popular a ferramenta, mais ela ultrapassa as fronteiras dos primeiros influenciadores, aqueles que geralmente possuem interesses em comum e pertencem a um grupo mais ou menos homogêneo. Com o crescimento das diferenças (e, consequentemente da adoção por grupos sociais diferentes), cresce também o estranhamento entre esses diferentes grupos. E, finalmente, com o estranhamento, cresce a preocupação com a privacidade.

A preocupação com a privacidade, portanto, tende a ser uma preocupação secundária da adoção. Claro que, a noção da privacidade é também cultural. Em uma pesquisa que realizei na Índia com outros colegas em 2007, percebemos que a construção do conceito de privacidade tinha a ver com os hábitos culturais dos indivíduos. Bem diferente do Brasil na época, quando colocar tudo público no Orkut era a regra, os indianos (especialmente as mulheres) já tinham uma preocupação forte para com o tipo de informação que era colocada online. Embora não deixassem de usar o site (e estavam começando a usar também o Facebook), as mulheres costumavam construir perfis que escondessem parte de sua identidade. O uso de fotos de flores, avatares, e etc. era extremamente comum. Já os homens, especialmente os mais jovens, tendiam a usar mais fotos de si - embora alguns procurassem colocar fotos a distância ou com óculos escuros. No Brasil, ao contrário, fotos que mostrassem bem o indivíduo eram a regra. Inclusive, colocar álguns públicos, também. Na Índia, muitos tinham já vários perfis, um para a "família", outro para os amigos. No Brasil, esse hábito ainda era incipiente.

É claro que esses níveis diferentes de preocupação para com a privacidade dos dados eram também culturais. Embora no Brasil o Orkut já tivesse atingido uma massa crítica, ainda eram poucos os relatos de mau uso de dados pessoais. Os adotantes ainda viam o sistema como constituído apenas de pequenos grupos de laços fortes e seus "conhecidos", pouco ou nada sabendo de outros grupos. Na Índia, ao contrário. Além de uma sociedade culturalmente mais conservadora em termos de privacidade, os indianos também conheciam todo o tipo de histórias de mau uso dos dados pessoais colocados online. Com essa preocupação em mente, eram muito mais cuidadosos que os brasileiros e a privacidade era uma preocupação freqüente. Na época, a adição de camadas de privacidade para os vários níveis da rede social foi uma das recomendações que fizemos ao Google.

Atualmente, a preocupação para com a privacidade começa a aparecer com força no Brasil. Com a cobertura da mídia de casos onde os dados foram mal utilizados, relatos de usuários que foram prejudicados e mesmo, uma percepção do alcance das conexões na rede, fizeram crescer a cautela dos brasileiros na Internet. Embora ela ainda seja menor junto aos mais jovens e as crianças, passa a ser um fato. Se observarmos o Orkut, por exemplo, a cada dia, mais e mais perfis começam a ter seu acesso limitado. Fotos raramente são públicas. Scraps (recados) estão cada vez mais restritos.

A tendência me parece, é que essa preocupação passe a ser, cada vez mais, a regra também para outras ferramentas, a partir de seu crescimento. Ou seja, mais do que uma cultural, a preocupação para com a privacidade dos dados na Internet, no Brasil, é uma conseqüência direta da percepção da adoção das ferramentas através das redes sociais.