Um post sobre Metodologia e Redes Sociais


#pqtwfollow2.jpgTenho recebido diversos emails com dúvidas e questões metodológicas. Como várias coisas são bem parecidas, pensei em escrever um pouco no blog a respeito. Então, primeiro é preciso fazer um esclarecimento. "Redes Sociais" ou "Redes Sociais na Internet" não são um método de pesquisa, são uma perspectiva teórico-empírica. Dizer que você está estudando redes sociais significa dizer que você está observando um determinado fenômeno a partir de uma perspectiva, de cunho estruturalista (embora eu defenda que ela também tem um foco funcional se o pesquisador desejar). Ou seja, significa que seu foco está na estrutura do sistema, que você vai observar como constituída de nós (ou nodos) e suas conexões. E há todo um foco teórico a partir desse foco, que já é construído há quase um século, como recuperei no meu livro.

Bom, também há focos metodológicos associados à perspectiva de redes sociais. Mas o fato de você escolher trabalhar com redes sociais não quer dizer, a priori, que vai ter que usar um deles. A perspectiva é bastante aberta e você pode sim usar o método que for mais adequado ao seu trabalho e ao seu problema de pesquisa. Dentro desses focos metodológicos, há quantitativos e qualitativos. A mim interessam as redes sociais na Internet. Há uma série de diferenças entre essas redes e as offline (a começar pelo fato de que são estabelecidas diante de representações dos sujeitos no espaço digital).

Focos Quantitativos

São aqueles que buscam estabelecer relações através das quantidades. A Análise de Redes Sociais (ARS), por exemplo, com sua base sociométrica é um dos principais deles. Na ARS, procura-se quantificar elementos e extrair deles propriedades mais globais, como, por exemplo, o quão clusterizada é uma rede. (O cluster é uma quantidade de nós muito conectada, ou seja, muito densa dentro da rede analisada.) Ou qual o grau de centralidade dos nós (ou o quão bem conectados eles são). Ou várias outras coisas. Aqui, geralmente trabalha-se com crawlers (softwares para coletar grandes quantidades de dados) ou mesmo com um grande set de dados obtidos pelo pesquisador. Também são utilizados softwares de análise de dados (como o Pajek e o NodeXL, por exemplo) e de desenho das redes sociais (como o NetDraw). Alguns desses softwares, como o NodeXL, são crawlers e softwares de análise ao mesmo tempo. Os focos quantitativos, em geral, são bastante interdisciplinares e há toda uma gama de ciências trabalhando com eles. O meu último post, focando a tag #smbr1995 é um exemplo de um trabalho com foco quantitativo. Mas nos meus trabalhos, tenho bem poucos com esse foco, notadamente os últimos artigos foram bastante focados em ARS (focando a difusão de informações no Twitter). Mas há vários pesquisadores que trabalham com esse foco e que você pode procurar, vou citar alguns cujo foco está nas redes sociais na Internet: Lada Adamic, Valdis Krebs, Bernardo Huberman, Scott Golder, Duncan Watts, Sandra Montardo e a Regina Marteleto (cujo foco não é bem redes sociais online, mas que tem vários trabalhos no Brasil focados em ARS) e a Suely Fragoso, que trabalha com redes de links (não são bem redes sociais, mas os princípios podem ser aplicados por analogia).

Focos Qualitativos

Também há focos que são fortemente qualitativos nas pesquisas sobre redes sociais. Esses focos preocupam-se com elementos qualitativos, como contexto, como a qualidade das trocas e como as apropriações sociais. Elementos de conteúdo, como tipos de capital social, formas de interação,construção de contexto, e estudo da conversação e etc. normalmente focam essa perspectiva para que se possa entender como acontecem. Há dois focos aqui: aqueles mais formais, que continuam explicitamente na estrutura da rede, suas constituições e seus efeitos e aqueles mais informais, que não focam a rede a partir de sua composição. Aqui, os pesquisadores estão menos preocupados com a estrutura da rede e mais com as interações dentro dela, seus efeitos, suas negociações. Este é o principal foco dos estudos das Ciências Sociais e da Cibercultura no Brasil hoje. O Alex Primo, por exemplo, busca entender como as interações constituem e influenciam essas redes e são influenciadas por elas. O José Carlos Ribeiro e os pesquisadores do GITS na UFBA também focam de forma qualitativa essas trocas em rede. A Adriana Amaral tem um foco forte nas questões culturais e subculturais nessas redes. Fora do Brasil, a danah boyd também tem um foco menos formal na sociabilidade e nas redes sociais. Já dentre aqueles mais formais, temos alguns trabalhos da Sandra Montardo, o Rogério da Costa (embora não especificamente em redes online), o Augusto de Franco e a Escola de Redes, a Gabriela Zago e eu. A maioria dos meus trabalhos tem foco qualitativo, de um modo especial, no capital social e nas conversações emergentes nessas redes.

Dentro desse foco qualitativo podem ser usados vários métodos, como etnografia virtual, análise do discurso, análise da conversação, entrevistas, análise de conteúdo e etc.

Focos Mistos

Também podemos encontrar focos mistos. Ou seja, estudos que misturam focos quantitativos e qualitativos para conseguir focar uma questão de pesquisa de modo mais amplo (é meu foco favorito, mas é bem difícil conseguir). Aqui há vários trabalhos bem legais, geralmente interdisciplinares, que pegam esse foco. Alguns:



Então, como escolher seu foco? É preciso, primeiro, definir qual é o seu problema de pesquisa e quais seus objetivos. A partir dessa definição, você escolhe qual o melhor meio de atingir o seu objetivo (quais variáveis vai usar, qual foco, quais elementos são importantes). E a partir dessas definições, você decide quais métodos são apropriados para sua pesquisa em redes sociais. :)

Para ler mais:

Artigos elencados pela danah boyd a respeito de sites de rede social

Artigos que eu elenquei e que focam redes sociais no Brasil