Crianças e o Youtube: Algumas observações


minecraftkids.jpgEstou envolvida em um trabalho do ESPM Media Lab (liderado pela Luciana Correa) que busca monitorar os canais do YouTube mais usados por crianças. Achei interessantíssimo o tema primeiro porque a maioria das pessoas que têm analisado o uso da internet não se deu conta do crescimento da rede no público infantil e também, porque o letramento digital dessas crianças, por causa dos smartphones, acontece cada vez mais cedo (os pais costumam usar desenhos no Youtube para entreter os pequenos, abrindo a porta de entrada da ferramenta para eles). Refletindo sobre essas questões e buscando dados nos últimos dias, tracei algumas linhas.

O fenômeno Minecraft

A primeira coisa é a popularidade dos canais para crianças. Recentemente, o Diamond Minecart, do britânico DanTDM, foi o canal com maior audiência da ferramenta, ultrapassando canais como o da Taylor Swift e o PewDiePie (famoso gamer), com mais de 400 milhões de views no mês. O canal, para quem não conhece, é focado no Minecraft, com vídeos de reviews dos diversos modes do jogo, personagens criados por Dan e animações dos joguinhos. Mas o mais importante não é isso. É o fato de que o TDM é um canal "familyfriend", ou seja, um canal com um conteúdo mais infantil. Enquanto experimenta os modes, por exemplo, Dan costuma ter a companhia de seus vários lobos de estimação ou do Dr. Trayaurus, seu... ahm... villager de estimação. O caso é que a audiência desses canais está cada vez mais jovem, o que Dan parece ter intuído. Além dele, outros canais focados no jogo e animações com seus personagens estão entre os mais populares. Vemos um fenômeno parecido no Brasil. Canais como AuthenticGames e RezendeEvil estão entre aqueles mais populares do Youtube no Brasil. São também canais focados em Minecraft, só que com um tom muito mais adolescente, embora sua popularidade também esteja crescendo junto às crianças. O conteúdo, entretanto, nem sempre é adequado.

Mas não só de Minecraft vivem as crianças no YouTube. Canais de unboxing (apresentação de brinquedos) e brincadeiras também são extremamente populares. 

Jovens Youtubbers

Com o crescimento dos diferentes canais, outro fenômeno está crescendo junto ao público infantil: A produção de conteúdo. Ao ver seus canais favoritos, as crianças não apenas querem usar o conhecimento adquirido nos jogos (Minecraft, por exemplo, é um dos jogos mais populares entre crianças no mundo e foi adquirido pela Microsoft ano passado), mas igualmente produzir seus próprios canais. A produção de conteúdo com smartphones e algum acesso à internet é cada vez mais acessível e cada vez maior entre os adolescentes (entretanto, em outras ferramentas). A tendência é que chegue agora para as crianças.

Questões Centrais

O crescimento da audiência infantil do YouTube levou também ao aumento da preocupação do acesso a canais pelos pais, especialmente a conteúdo não próprio. Com isso, o Google anunciou o YouTube Kids, uma espécie de "portal de entrada" para as crianças na ferramenta, que promete dar aos pais maior controle ao que as crianças acessam (que ainda não tem no Brasil). Mas o acesso a conteúdo impróprio não é o único problema. Além do acesso a conteúdo, outras questões fundamentais dizem respeito à privacidade (O crescimento de canais protagonizados por crianças, por exemplo, pode colocar em risco sua privacidade? Quais efeitos esses canais podem ter no futuro dessas crianças? Como a memória da internet pode afetar, com essas produções, a vida futura?), questões financeiras e jurídicas (Muitos destes canais são explorados pelos pais e produzem milhões de dólares anualmente, que as crianças produtoras não recebem diretamente. Como ficam essas questões?) e, ainda, questões educacionais (Qual será o papel da escola para crianças que já aprenderam a ler para fazer buscas no YouTube, que já estão acostumadas a acessar e produzir conteúdo altamente hipermidiático?). Outra questão que tem sido levantada é o targetting de crianças como público alvo de anúncios na ferramenta, anúncios que muitas vezes não são desejados pelos pais. Muitas dessas preocupações já foram expostas em relatórios internacionais (gosto muito do Digital Media and Learning que, inclusive, com webinars sobre como as escolas podem usar o Minecraft como parte do currículo como modo de estimular experimentos e conteúdos, além de outras questões amplas), bem como passaram a ser discutidas em várias esferas, principalmente nos EUA e na Europa. Mas ainda são pouco discutidas por aqi. Creio que é um fenômeno que precisamos olhar com mais cuidado.