[08 de agosto de 2011]

Jornalismo e Redes Sociais: Legitimação, Filtragem e Aprofundamento

21165559_Twitter-Journalism.jpg A intersecção entre Jornalismo e Redes Sociais está cada vez mais complexa. Recentemente, o Facebook começou a olhar com mais carinho para os jornalistas. Fez um grupo (o Facebook+ Journalists) e, inclusive, lançou uma cartilha chamada "Facebook Journalism 101" (focado principalmente na questão técnica de como dividir histórias, construir perfis e etc.). Um dos focos da companhia parece ser aquele de reconhecer a importância dos processos de difusão de informações, tentando gerar um espaço semelhante ao Twitter nessa apropriação. Essa e outras ações me motivaram a pesquisar um pouco como o jornalismo está acontecendo nas redes sociais, fundamentalmente do ponto de vista da difusão de informações. Será que as informações jornalísticas são difundidas de modos diferentes? O que faz uma notícia nas redes sociais? Será que o jornalismo realmente morreu?

Para tentar entender esses processos, iniciei um mapamento via NodeXL+ Migre.me no Twitter no início do ano e depois passei a explorar algumas hashtags noticiosas. Várias coisas interessantes surgiram. Uma parte desses apontamentos está em um artigo que enviei pra um congresso recentemente. Pensei, assim, em discutir um pouco aqui algumas coisas que estão aparecendo, de um modo especial, algumas funções que parecem ser atribuídas ao jornalismo nesse espaço, de forma, é claro, simplificada.

Uma das primeiras funções que apareceu nos dados foi a função de legitimação. Por exemplo, mapeando tweets relacionados com eventos noticiosos (vou exemplificar aqui dois, a morte da cantora Amy Winehouse e os atentados em Oslo), vê-se claramente que há dois tipos de tweets: aqueles que dizem que algo ocorreu e pedem mais informações e aqueles que difundem informações supostamente relacionadas com o fato. Dentro dessa segunda categoria, os tweets de veículos jornalísticos parecem ser aqueles que são mais retuitados e comentados. Ou seja, o furo não é dado pelo veículo (todo mundo está sabendo que algo ocorreu), mas a legitimação da notícia, sim (mas ficam esperando um veículo jornalístico "confirmar" o evento).

oslo2.png

Essa primeira imagem mostra alguns dos primeiros tweets a respeito dos atentados em Oslo que usaram a hashtag ou a palavra "Oslo". No centro, em vermelho, está um dos primeiros veículos a noticiar o fato, o @SkyBreakingNews. Note-se a quantidade de tweets buscando informações, sem referência a ninguém (conexões).

oslo3.png

Essa segunda imagem já mostra as informações relacionadas a hashtag #Oslo ou usando a palavra Oslo algum tempo depois. Note-se que o veículo jornalístico (mesmo nó vermelho central) torna-se ainda mais central no grafo, com mais referências e mais citações a ele. Há outros veículos no grafo já sendo citados também (notadamente, outros nós com bastante conexões). O principal valor, aqui, do jornalismo, é aquele da credibilidade, de legitimar o evento como fato.

A segunda função é aquela de aprofundamento. Ok, todo mundo sabe que alguma coisa aconteceu, milhares de informações foram repassadas sobre isso. Mas as pessoas querem saber os detalhes: o impacto, a ação da polícia, o número de mortos e etc. Esses detalhes também são procurados nos veículos jornalísticos e são repassados a partir deles. Aqui, outro exemplo relacionado com as notícias da morte da Amy. Ainda já várias horas depois da morte da artista, retweets e informações relacionadas com o evento, dadas por veículos eram aquelas mais repassadas.

amy3.png

O nó vermelho central aqui é a @RollingStoneBR falando da autópsia da cantora. Entre outros veículos que apareceram no mapeamento no final do dia, estão veículos relacionados com a música (por exemplo a @MTVnews entre outros).Relacionada com essa função está aquela de filtragem, ou seja, do jornalismo filtrar as informações que têm fundamento daquelas que não têm. Quando os dois fatos apareceram no Twitter, imediatamente diversos boatos passaram a circular, bem como informações falsas e links maliciosos. Talvez daí o reforço do valor credibilidade para os veículos jornalísticos e para o jornalismo de tabela.

Há mais o que discutir, mas fica para outro post. O que se observa, com esses primeiros apontamentos, é que o jornalismo retém para si a função principal de filtrar, dar crédito e legitimar os eventos noticiosos, declarando o que é e o que não é. Ou seja, observa-se uma manutenção do lugar de fala do jornalismo enquanto reprodutor daqueles discursos que "precisam" ser ouvidos. Em um mundo de liberação do pólo emissor e de horizontalização das informações, isso é curioso, porque mostra que continuamos dando ouvidos (ou lendo, como queiram) as velhas fontes de sempre. De uma certa forma, também aponta para relfexões com relação ao informational overload e à atenção como recurso escasso por conta dessa imensa quantidade de informações circulando.

Apesar das possibilidades de participação dessas ferramentas, as notícias que vêm por outras vias necessitam de alternativas para alcançar níveis de difusão semelhantes àquelas dos jornais. Ou um grande hub com muita crediblidade, por exemplo, ou uma grande quantidade de pessoas reforçando a informação. Da grande maioria das notícias mais repassadas e links que atingem nós mais distantes da rede que eu consegui coletar estão apenas notícias dadas por veículos. Curioso, não? Mas é assunto para outro post que este já está imenso. :) E claro, o próximo passo é investigar como essa legitimação acontece no Facebook. A julgar pela "cartilha" deles, o processo é bem semelhante. E outro post também é merecido com o foco no que as redes fazem pelo jornalismo (e não o que o jornalismo faz pelas redes), sobre o que já escrevi há alguns anos.
por raquel (07:59) [comentar este post]


Comentários

Daiana (agosto 8, 2011 10:59 AM) disse:

Olá Raquel, ótimo post! a legitimação das organizações jornalísticas na atualidade é um ótimo tema para discussão! eu trabalho com a análise dos processos de legitimação das empresas através de seus portais na internet. Um livro que discorre sobre a legitimação é "a construção social da realidade" de Berger e Luckmann. Abraços

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