[18 de maio de 2008]

Memes, Motivações, Blogs e Redes Sociais

infdif.jpgUma das pesquisas que eu atualmente estou conduzindo busca compreender as motivações que as pessoas têm para "passar" uma determinada informação adiante e como essas motivações influenciam a forma através da qual a rede social "reverbera" a mesma informação. Tenho um projeto que conta com o apoio do CNPq para estudar essa questão nos blogs, e de um modo específico, na blogosfera brasileira. Uma das minhas hipóteses é a de que parte das motivações das pessoas para publicar uma informação e não outra refere-se ao ganho social percebido nesta difusão.

Eu chamo essas informações passadas adiante de memes, apesar desta conexão não ser minha e já ser bastante popular nos estudos de difusão de informação nos blogs (vide Adar, E., Zhang, L., Adamic, L. A., & Lukose, R. M, 2004 e Halavais, A. C., 2004, por exemplo). É um conceito controverso, mas bastante adotado pelo seu caráter "viral" de compreender o espalhamento das informações. Um meme, assim, é compreendido como aquela informação (quase sempre associada a um link) que é propagada blog a blog, a partir da idéia do Richard Dawkins no livro "O gene egoísta". Há uma parte da literatura que tenta observar os padrões de difusão dessas informações e outra parte que busca compreender os mecanismos através dos quais essas informações são espalhadas (como piadas, vírus de e-mail, sites legais e etc.), o que influencia bastante a visibilidade na blogosfera. Inicialmente classifiquei os memes em dois tipos:interacionais e informacionais. O primeiro tipo compreende a informação que apela para seu valor social, ou seja, que tem um alto caráter conversacional, polêmico ou simplesmente, de diversão e que é publicada com o foco na interação na rede social. O segundo compreende a informação cujo valor é mais relacionado à noticiabilidade, ou seja, ao furo, à informação que será divida com a rede social. No meme interacional, o valor está no fato do mesmo ser "reverberado" por outros blogs e comentado (logo, esse tipo de meme é frequentemente espalhado por dentro dos clusters das redes de blogs). No meme informacional, o valor está no fato de se ser o primeiro a publicar na rede (logo, esse tipo de meme raramente se espalha pelos clusters, mas normalmente atinge um único nó de cada cluster). A idéia é primeiro verificar essas conexões de um ponto de vista qualitativo e, em um segundo momento, através da análise de redes sociais. Até então, tenho 54 entrevistas em profundidade com blogueiros, 150 blogs observados e 988 memes coletadas com um padrão observável.

O objetivo deste post é mostrar alguns dos resultados que estão aparecendo no meu trabalho, os quais vou apresentar na Hypertext 2008, mês que vem. Duas coisas parecem bastante promissoras. Um dos primeiros resultados que apareceram na minha pesquisa foram as motivações das pessoas e o tipo de meme publicado. Relacionei, assim, os memes interacionais com as motivações de a) criar um espaço pessoal (o que relaciona-se com a interação na medida em que é requisito desta reconhecer, em um blog, a "voz" de alguém); b) criar interação, ou seja, receber comentários, ver outros blogueiros comentando o mesmo fato. Já os memes informacionais seriam relacionados com outras motivações, a saber a) criar autoridade ou reputação, onde o objetivo é ser reconhecido como "autoridade" em um determinado assunto ou expor um conhecimento específico; b) gerar popularidade, ou seja, receber links e tornar o blog um conector; c) criar -e dividir - conhecimento, ou seja, dividir uma informação, gerar debate e proporcionar conhecimento para a blogosfera. Ou seja, até então tenho uma pequena confirmação de que a identificação, ainda que inconsciente dos valores presentes nas informações divulgadas e na percepção da própria rede social influencia, e muito, o padrão de difusão que esta informação terá na blogosfera.

A partir desta construção, estou tentando discutir as estruturas de espalhamento das informações e as percepções dos blogueiros de suas próprias redes sociais. Ou seja, as informações são publicadas com foco no que o blogueiro constrói como sua "audiência" na rede social, mesmo que sua percepção não seja condizente com a realidade. O objetivo é compreender um pouco melhor se há algum tipo de padrão estrutural das redes que proporciona tipos diferentes de difusão.

A idéia de postar um pouquinho da pesquisa aqui - e é só um pouco dela mesmo - nasceu da proposta de dividir conhecimento e verificar como a rede social reverbera as informações. O resumo do trabalho está disponível online e o original está na biblioteca da ACM. Infelizmente só tem uma versão em inglês disponível mas, em breve, termino o segundo paper sobre o assunto e, desta vez, espero fazer uma versão em português, mas quem quiser, pode enviar um email que mando o paper original.

Fonte da Imagem: Trabalho da Lada Adamic.
por raquel (18:52) [comentar este post]


Comentários

rogerio christofoletti (maio 18, 2008 7:13 PM) disse:

A pesquisa é super interessante e oportuna, já te disse outra vez. Gostaria de ler o artigo e, depois da sua volta, saber que tipo de recepção seu trabalho teve por lá. Sua pesquisa, pelo que vejo, não chega a ter interlocutores diretos no Brasil, mas colaterais. Até porque ela acaba "esbarrando" em outros assuntos que estão sendo perseguidos por muitos, como é o caso da reputação-credibilidade. Vai fundo, garota!

Raquel (maio 18, 2008 7:21 PM) disse:

Rogerio, essa dificuldade de encontrar interlocução me aflige. Justamente por isso que estou fazendo um super esforço e indo para a Hypertext mesmo sem o apoio do CNPq para a viagem. Espero que lá eu consiga sair um pouco da caixa e pensar um pouco mais na questão. :)

rogerio christofoletti (maio 18, 2008 9:05 PM) disse:

Bon Voyage!
Good Trip!

manda ver!

pirs (maio 18, 2008 9:11 PM) disse:

eu li isto um dia e acho que é interessante, mesmo sendo de brincadeira.

The Lifespan of a Meme
1. A meme is born
2. The meme becomes popular local to its origin
3. Compounded overuse causes the meme to be burned into collective memory and distributed across the internet
4. The meme has reached the bottom of the internet
5. In some cases the meme has gone even lower and surfaced IRL (In Real Life)
6. Those that gave birth to the meme are filled with regret
7. The meme lives on, spreading, becoming more and more deluded over time
8. The meme ends up on Snorg Tees
9. The meme has transformed into cancer
10. The meme then must be tossed into the fires of Mount Doom by a rather unsuspecting hobbit for its evil to be banished
11. Nobody gives a shit
12. OM NOM NOM NOM NOM NOM
13. ????
14. Profit!

ignore os últimos 4 (ou 7); são piadas internas/memes, heh.

Wilker (maio 18, 2008 10:12 PM) disse:

Oi Raquel!

Você pode me mandar por e-mail seu artigo ao qual você faz alusão neste post?

Obrigado desde já!

Abraços!

Wilker.

Obs: wilker.mello@uol.com.br
Não esquece do ponto entre wilker e mello :)

Roney Belhassof (maio 19, 2008 10:30 AM) disse:

Agora entendi porquê meu blog é desconhecido! ;-) Minha motivação raramente toca nas duas "memêmicas" passando mais pela necessidade de compartilhar meus questionamentos pessoais sobre a vida e não sou o tipo de pessoa com questionamentos ou ótica muito comuns.

Só recentemente comecei a fazer umas video-aulas com informações úteis para todos que usam Internet, vamos ver se alguma vira meme.

Sua pesquisa ao meu ver é importantíssima e entendo que pode nos ajudar a criar uma fotografia da sociedade em um dado momento. Essa é uma das questões que sempre me perturba: estamos nos tornando mais sensíveis ou mais insensíveis? Mais humanistas ou mais fascistas? Mais raciionais ou mais superticiosos?

Talvez a análise do funcionamento dos memes nos ajude a perceber os paradigmas, crenças e princípios de moral mais comuns em cada grupo social...

@alexdc (maio 19, 2008 8:04 PM) disse:

Tb achei essa pesquisa super interessante. Tentei pegar o RSS feed do teu blog, mas parece que nao esta funcionando ...

//pontomidia.com.br/raquel/arquivos/index.xml

Raquel (maio 20, 2008 7:12 AM) disse:

pirs, Roney, Wilker e @alexdc: Valeu. :)
@alexdc Acabei de testar o feed e tá funcionando sim... Que erro que aparece pra ti?

Wilker: te mando hoje, na seqüência do dia, ok?

Orlando (maio 20, 2008 11:31 AM) disse:

Cara Raquel,

Gostaria de tentar compreender a metodologia da sua pesquisa.
Vc me envia o paper original?!

Obrigado.

J.P. de Paiva (maio 21, 2008 5:35 PM) disse:

Oi Raquel,

Achei muito interessante o teu post, gostaria de saber um pouco mais se vc me puder enviar seu artigo para meu email.

Estou trabalhando na minha tese de mestrado na Universidade de Lugano na Suíça, o título é "Dissemination of Knowledge and Culture on the Web 2.0: a Case for Brazilian Music." O teu site foi um achado! Eu já tinha encontrado uns artigos no Google Scholar, e já li até um artigo de Christofoletti a respeito de blog jornalísticos no Brasil.

Em relação a blogs, eu não sei se vc já leu o trabalho da Lilia Efimova. Ela tem uns artigos interessantes, mas mais relacionados as estruturas conversacionais do que a blogosfera em termos de rede sociais. Alvin Goldman, um filósofo da Universidade do Arizona, no seu livro "Knowledge in a Social World" fala a um pouco a respeito das motivações da transmissão de informação. Ele cita o filósfo escocês do século 18 Thomas Reid que diz que as seres humanos tem uma tendência inata para falar a verdade, ou seja, transmitir conhecimentos que considerem verdadeiros. Claro que isso é um ponto filosófico que demanda situações ideais que pouco condizem com a realidade, principalmente na internet onde a questão de identidade é crítica.

Mas voltando a "realidade". Dentro da sua pesquisa, qual é realmente o peso dos clusters? Os que são muito conectados entre si acabam dando vida curta às memes não? Vc já conseguiu definir qual seria o balanço entre densidade de conectividade dos clusters para elas ganharem um pouco mais de sobrevida?

Muito obrigado, já vou colocar o teu link no blogroll do meu "blog de leite". :-)

jp

ps: eu descobri seu blog através do Filipe Barros numa conversa de Skype a respeito da Web 2.0 no Brasil.

Raquel (maio 28, 2008 12:16 PM) disse:

Orlando: já te mandei! :)

JP: Muito legal teu comentário! Eu ainda não defini a importância dos clusters pq não peguei nenhum - estou ainda nas chamadas redes "mundos pequenos". Eu acho que a questão da densidade é proporcional ao número de conexões - uma coisa meio Dunbar number - que a rede suporta. Quando cresce demais, há uma desestruturação e o rompimento da rede. Mas essa é só uma hipótese, porque não consegui coletar dados o suficiente para sair do estudo de caso.

Daiane (julho 19, 2008 5:56 PM) disse:

Oi Raquel!

Desde que comecei o mestrado vejo seu nome cada vez que procuro referencias para minhas pesquisas mas nunca tinha entrado em contato... Bem, antes tarde que nunca!
Sua pesquisa eh super interessante e tangencia alguns estudos que estao em andamento na area de comportamento do consumidor e cultura de consumo. Eu tambem estou comecando um estudo em um grupo de blogs relacionados ao movimento "Fat Acceptance" e vou passar a acompanhar seu trabalho mais de perto. Pra comecar, vou passar o domingo no arquivo do seu blog :)

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