[02 de outubro de 2008]

O que é Mídia Social?

midiasocial.jpgEsses dias o Träsel me fez essa pergunta, que há algum tempo eu discutia com a Giseleh. Como definir mídia social? E daí que eu fiquei pensando no que seriam realmente esses sistemas e na minha percepção deles e resolvi jogar a discussão aqui no blog.

Definindo Mídia Social

Mídia social para mim é aquela ferramenta de comunicação que permite a emergência das redes sociais. Para permitir que as redes sociais emerjam, esses meios de comunicação precisam subverter a lógica da mídia de massa (um->todos) para a lógica da participação (todos<->todos) (como o Palacios já falava desde 1995). Mídia social, assim, é social porque permite a apropriação para a sociabilidade, a partir da construção do espaço social e da interação com outros atores. Ela é diferente porque permite essas ações de forma individual e numa escala enorme. Ela é diretamente relacionada à Internet por conta da expressiva mudança que a rede proporcionou. Mas não acho que seja, como muitos explicam, uma característica da chamada Web 2.0. Acho que foi sim, reforçada nos últimos anos, mas sempre esteve presente enquanto potencial da Internet (lembro, por exemplo, das listas de discussão, fanzines online e etc. que são bem anteriores. O próprio Rheingold fala da The Well no "A Comunidade Virtual", que poderia muito bem ser enquadrada como mídia social a partir da minha definição ainda no início da década de 90.)

A danah boyd fala em um artigo que existem públicos mediados em espaços mediados e explica que há quatro características desses espaços que seriam diferentes e fundamentais: persistência, searchability ("procurabilidade"), replicabilidade e audiências invisíveis. Essas quatro características são aquelas que possibilitam, na minha opinião, o surgimento da chamada mídia social junto aos públicos. É o fato de que é possível dizer e as "falas" persistem no espaço da mídia social, por exemplo, que há a possibilidade de construção de conversação assíncrona. É devido à característica da invisibilidade das audiências que formas de capital social diferenciadas são criadas. No entanto, não diria que essas são características da mídia social, mas unicamente do ambiente onde essa mídia emerge. Assim, quais seriam as características da mídia social?

Características da Mídia Social

A mídia social, para mim, teria ainda alguns elementos especiais, que a diferenciam das demais ferramentas de comunicação. Esses elementos caracterizam esse tipo de ferramenta diante da minha definição.
  • Apropriação Criativa: Os usos da mídia social são sempre criativos, diferentes do propósito original, dentro da lógica dos usos que o André Lemos apresenta no seu livro, "Cibercultura". Inclusive, a apropriação da mídia social é um forte indicativo de sua pertinência e vida junto a um grupo social. Na mídia social, esses usos seriam uma constante da presença de novos grupos e sua construção como artefato cultural desses. Uma mídia social que deixa de apresentar usos criativos está fadada.
  • Conversação: Mídia social é conversação. Mais do que a mera participação, ela permite que os atores possam engajar-se de forma coletiva, através da cooperação e mesmo, da competição. Assim, a possibilidade de conversação síncrona ou assíncrona é uma característica desse tipo de ferramenta. Por isso, mídia social é tão relacionada ao buzz das redes.
  • Diversidade de Fluxos de informações: A mídia social permite que vários fluxos de informações diferentes circulem através das estruturas sociais estabelecidas nela. Esses fluxos podem ser, inclusive, opostos, e podem gerar mobilização social, bem como capital social e discussão. A diversidade desses fluxos é uma característica desse tipo de mídia, conseqüência direta da Sociedade da Informação e das trocas sociais dos atores.
  • Emergência de Redes Sociais: A mídia social possibilita a emergência de redes sociais através de sua apropriação e conversação. Isso se deve ao fato de ela permitir que os rastros da interação fiquem visíveis, permitam que a interação seja extendida no tempo e que as redes sociais sejam mais observáveis. A mídia social, assim, complexifica o espaço social, permitindo novas emergências de grupos. Esses grupos podem constituir-se também como comunidades virtuais.
  • Emergência de Capital Social Mediado: A mídia social possibilita que novas formas de capital social surjam e sejam apropriadas. Ela permite também a criação de valores coletivos e individuais mais facilmente perceptíveis pelos atores da rede. É por conta disso que a apropriação pode ser modificada e reconstruída nesses espaços diante dos valores concebidos pelos grupos. Esse capital tem o diferencial de ser independente da interação direta: é possível ter acesso aos valores construídos por um grupo sem fazer parte dele - daí os freeriders-, e também é possível apropriar-se desse capital e transformá-lo em outro tipo de valor - buscar uma informação altamente especializada, por exemplo.


Assim, do meu ponto de vista, a mídia social é um tipo diferente de meio que é também artefato cultural, que não possui nem as funções e nem as características do discurso da mídia tradicional. Ela é um meio fundamentalmente social, que atua na informação como conseqüência disso. Mídia social poderia também ser discutida como micromídia, como a Adriana Amaral aponta na tese dela (2005), no sentido de sua apropriação individual e social. Reflexões em progresso a respeito do assunto. :-)
por raquel (13:45) [comentar este post]


Comentários

Sec2o (outubro 2, 2008 3:01 PM) disse:

algumas perguntas que me vieram à mente:

não tem como controlar, certo? não tem como ser onipresente, certo? não tem como moderar/censurar, certo?

o que a publicidade precisa fazer para não ficar de fora? porque acho que o problema não está só nas marcas, mas sim principalmente no modelo tradicional de publicidade, que se apropria do tempo e do espaço das pessoas.

Até me vêem algumas respostas-padrão para isso, mas será que o modelo realmente não está em cheque, como disse a Marta neste post - http://bonafidemarketinggenius.com/2008/10/01/why-traditional-advertising-is-kinda-fked-and-what-they-should-do-about-it/ ?

até

Träsel (outubro 2, 2008 3:09 PM) disse:

Bons insights. O grande problema é que "mídia" e "social" são termos de significado muito amplo. Por exemplo, as idéias expressas no teu texto partem da premissa de que ferramentas como blogs, microblogs, videologs, fotologs e Orkuts e Facebooks da vida sejam todos mídia. Mas serão mesmo? Ou se tornam mídia quando apenas quando as redes sociais emergem? Telefone, por exemplo, nunca foi considerado mídia (ao menos pela maioria dos pesquisadores) por ser bidirecional. Há até quem discuta se a própria Web é mídia.

Já social tem o problema de que tudo o que um ser humano faz é, em algum aspecto, social. Até mesmo escrever um diário privado depende de a pessoa estar integrada a uma coletividade.

Enfim, só algumas idéias que têm me atormentado quando penso em como conceituar mídia social.

Adriana Amaral (outubro 2, 2008 5:21 PM) disse:

Raquel, obrigada por citar essa questão da micromídia, mas quem propôs foi a Sarah Thornton em seu estudo sobre os usos e apropirações das mídias pelos clubbers em 1996 e ela nem chega a entrar na internet. Na minha tese, eu falo brevemente sobre isso (não consegui catar a página aqui, outro dia eu acho), uma vez que toda a constituição discursiva, de práticas, usos, etc da rede segue de certa fórmula uma lógica similar a algo que só era possível nos antigos fanzines mimeografados, flyers de festas e boca-a-boca, etc.

Bem antes da cauda longa ela já falava sobre a mídia de nicho. Para ela essas mídias são complementares às mídias mainstream por darem visibilidades às subculturas de forma bottom-up.

Como temos visto pelas fragmentações subculturais (estou usando esse termo, mas se fôssemos seguir a Thornton e outros autores seriam pós-subculturais) na rede, as mídias sociais poderiam ser analisadas como um misto entre mídia de nicho e micromídia, onde emergem redes sociais e comunidades, mas que prescindem do DIY, como tu mesma aponta ai na tua discussão.

Mesmo assim, o termo mídia social ainda me incomoda bastante, tanto quanto Web 2.0

Eu teria mais algumas coisas pra falar sobre a questão do artefato cultural, que como tu bem sabes é um conceito que tenho trabalhado, mas tô com dor de cabeça então fica pra depois :)

Guilherme Nascimento Valadares (outubro 2, 2008 5:21 PM) disse:

Social Media me faz pensar logo de estalo em palavras-chaves:

digital, compartilhado, colaborativo, etc

A própria definição do termo não vem de um parágrafo enxuto, conciso e acadêmico. Vem de tags!

Melhor não fica.

Adriana Amaral (outubro 2, 2008 5:23 PM) disse:

A dor de cabeça está tanta que cometi alguns erros atrozes de portugues q nao tenho como editar aqui no comment, mas espero que tenha dado pra entender de qqer forma. Vou ali deitar pra ver se melhoro.

Ânngelo (outubro 2, 2008 5:33 PM) disse:

Oi Raquel, eu assino o blog via rss, mas depois de ler o texto tive que vir aqui comentar.

Muito bom o texto. E sempre muito difícil explicar para as pessoas o que é Social Media.
Agora, graças ao seu post,tenho um link certo para encaminhar e me ajudar na explicação.

Henrique Antoun (outubro 2, 2008 9:44 PM) disse:

Passei aqui depois que o Caribé comentou o texto no twitter com link! :-) Mídia social é um termômetro para a demanda de participação das populações como remediação para o estado de arte da tv. Quando o processo de empurrar pela goela à baixo dos outros (eufemisticamente referido como "tecnologia push") a informação que foi paga para ser dada se torna soberano (1984), surgem os hackers que invadem redes (cDc - cult of Death cow) e os grupos de discussão da USENET. Pouca gente parece disposta a tirar conclusões dos fatos que estão expostos para quem quiser ver. É como se fosse casual que o P2P seja o modelo dos negócios de sucesso na rede. Agora mesmo, na eleição americana, McCain pagou uma nota preta ao Google e Digg para aparecer no topo dos resultados sem nenhuma melhora assinalável. Hillary montou uma campanha caríssima e imbatível no velho modelo de massa. Enquanto isso Obama que desenvolveu a candidatura dele desde 3 anos atrás através do Move On e blog boomers detonou os dois gastando muito menos que eles. A Internet é mídia social porque as populações ficaram de saco cheio de ouvirem caladinhas.

Ricardo Oliveira (outubro 3, 2008 7:40 PM) disse:

Raquel, ótimas considerações mesmo. Acho que vc está certíssima ao afirmar que mídias sociais não dependem exatamente da Web 2.0. Mas, no estudo que fiz durante minha mono, percebi que o que a Web 2.0 influencia nesse contexto, é numa questão técnica mesmo. A partir de novos aplicativos, somados aos CMS, a gente pode se deparar com uma emergência do uso dessas mídias. Seja no um/todos ou no todos/todos. Ou seja, antes podiam até existir fanzines eletrônicos, mas dava um trabalho monstro criá-los, porque o editor precisava contratar alguém ou ele mesmo entender de HTML para montar seu site. Hoje não, basta se cadastrar em qualquer serviço de blogging que a coisa anda. E estes serviços estão imergidos justamente no que o pessoal do livro Planeta Web 2.0 chama de princípcios dessa segunda geração da web. Mashups, redes sociais, cultura colaborativa, inteligencia coletiva, etc etc.

Um artigo que está pra sair e que eu ainda não li, é do Marcos Nicolau, aqui da UFPB, que defende a idéia de que, na verdade, todas as mídias estão se transformando em mídias de relacionamento ou de socialidade. É algo a se pensar. Pq é uma tendência clara que os meios de funções massivas vão usufruir cada vez mais de funções pós-massivas, vivendo uma nova remediação, como defende o André Lemos.

abraço's

Ricardo Oliveira (outubro 3, 2008 7:42 PM) disse:

Ah, e minha mono tá disponível aqui [ http://diversita.blog.br/blog/2008/09/12/monografia-o-retorno/ ]. Seria um prazer gigante ter sua opinião sobre ela. Será publicada por uma editora independente até o fim do ano. Té+

Suzana Gutierrez (outubro 4, 2008 8:19 PM) disse:

Oi Raquel

Sigo a Adriana na maior parte dos argumentos que ela trouxe. Os conceitos de midia social e web 2.0 precisam mesmo de uma discussão cada vez que adentram a cena.

A hype em torno do uso destes termos tende a gerar bastante confusão.

A mim preocupa o aspecto estático que a maioria das definições proporciona, focando ora no suporte, ora na rede social possivelmente criada (embora o dinamismo da rede). Falta uma centralidade no processo, nas relações sociais que, elas sim, vão determinar "momentos midia social".

Nestas, o Orkut não é uma midia social e tampouco a comunidade X do orkut o é. Na relação tá a coisa.

Não estou muito boa com as palavras hoje, mas é por aí que ando pensando.

abraço!

Su

Livia (outubro 7, 2008 12:39 AM) disse:

Preciso dizer que você é uma das jornalistas mais incríveis que já encontrei. Seus textos são fantásticos. Obrigada por escrever a respeito da web, de blogs, comunidades virtuais, etc. é muito difícil encontrar livros sobre o tema, mas você seus colegas, como li nos links ao lado, conseguem suprir nossas necessidades (estudantes de jornalismo).

Abraço e sucesso,

Livia

Raquel (outubro 7, 2008 2:31 PM) disse:

Finalmente, um tempinho para responder. Vamos por partes que o povo caprichou nos comments.

@sec2o: Acho que a publicidade precisa entender a lógica e propor apropriações que sigam essa lógica. Não é fácil, mas é preciso, sobretudo, originalidade e criatividade.

@Trasel: Com certeza. Tens toda a razão. Mas acho que o "social" nunca foi tão "social" quanto hoje. :-)

@Adriana Amaral: A gente jah discutiu no plurk. :)

@Anngelo: Valeu! :)

@Henrique Antoun: que honra a sua visita! :D Adorei a contribuição.

@Ricardo Oliveira: Ótimas sacadas. Vou ler a tua mono. :)

@Su: Adorei o comentário também. Acho que é isso aí, precisamos ter espírito crítico e começar a discutir a construir o sentido dos termos que usamos. :D

@Livia: ##fiquei vermelha## Obrigada. :)

Carlos Eichenberger da Silva (outubro 8, 2009 5:06 PM) disse:

Acho que depois de ler tudo que escreveram de mídia social cheguei a uma conclusão.
Sou ignorante no assunto.
Boa Sorte fui.

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