[25 de outubro de 2010]

Por que o Twitter é tão popular no Brasil?

twitter_bird.gifA Time fez uma matéria já bastante comentada pela Rede a respeito da popularidade do Twitter no Brasil. De acordo com a revista, enquanto o Twitter pega cerca de 23% dos internautas no Brasil, só 11,9% dos americanos usam. Finalmente, o Brasil ainda seria responsável por quase 65% do tráfego no site. Já que estou acompanhando o Twitter de perto faz algum tempo, resolvi comentar.

A matéria traz uma entrevista com o James Green,da Brown University, que contextualiza as ferramentas de mídia social, dizendo que após anos de ditadura no Brasil, elas são um modo de "contra-atacar" com liberdade de expressão. Além disso, o professor cita ainda a criação de espaços de inclusão digital, o aumento da classe média, o contraponto à mídia tradicional.

Embora essas razões apontadas pelo Green sejam relevantes e, inclusive, importantes, não sei se dão conta do fenômeno. O Orkut, como a matéria lembra, também é grande no Brasil. Além disso, o Brasil tem uma larga história de adoção dessas tecnologias mais "sociais", como o Fotolog (o Brasil foi, por um bom tempo, o primeiro país em número de fotologs; weblogs, e, para entrar nos tempos do passado remoto, inclusive IRC). Estudei vários desses fenômenos a fundo e diria algumas coisas um pouco diferentes.

Algumas razões...

O Brasil já tem uma história de adoção de ferramentas sociais. Isso faz com que novas ferramentas sejam mais rapidamente apropriadas. Ou seja, já há uma apropriação social da Internet no País, o que torna o terreno propício para outras ferramentas do gênero. Outra questão importante, é que o Brasil é um país muito receptivo às tecnologias de informação e comunicação. A adoção do celular aqui é massiva, assim como dos computadores e da Internet (embora em menor grau). Creio que isso tudo pode ter sim um fundo na busca da liberdade de expressão, como afirma o Green, mas acho que há outras razões. Eu enumeraria uma delas como sendo a ativa comunidade do software livre que existe no Brasil, que acaba influenciando a discussão das TICs e a adoção dessas tecnologias (sim, entre os early adopters do Orkut estão eles). Outra seria a própria cobertura da mídia a respeito da adoção dessas tecnologias, o que gera ainda mais apropriação. Finalmente, eu diria ainda que há um sentido construído em torno das tecnologias aqui como firmemente positivas. As TICs são vistas como algo a aspirar, objeto de desejo e poder. Ou seja, há a questão da construção de sentido do consumo da tecnologia como algo necessário para o sujeito.

Mas por que o Twitter é especial?

O Twitter é um pouco diferente. Primeiro porque sua adoção não é apenas social no sentido que foi dado ao site de rede social (como o Orkut, por exemplo). É uma tecnologia de informação. Lá pelos idos de 2008/2009 eu e a Gabriela Zago publicamos alguns trabalhos sobre isso (o último foi publicado recentemente), onde discutíamos a apropriação do Twitter menos como rede de conversação e mais como rede de informação (vou referenciar no final). Com isso, o Twitter dá acesso a determinados tipos de capital social que outras ferramentas não dão, fazendo com que as redes sociais ali presentes funcionem como filtro das informações, organizando e tornando relevantes coisas específicas para seus grupos de interesse. Com isso, o Twitter conseguiu se tornar relevante para grupos de influenciadores no Brasil, como pessoas que trabalham com Internet e mídia. E virou pauta de matérias e se difundiu.

Em um segundo momento, vieram as legiões de fãs. Ou seja, principalmente adolescentes e jovens que viam no Twitter uma forma de "estar junto" de seus ídolos. Essa segunda onda é muito mais conversacional e passou a usar o Twitter como espaço de organização, criando Trending Topics como forma de "marcar presença". Assim o Twitter passou a congregar também ainda outras formas de capital social. Nessa fase, a presença dos "famosos" e das celebridades, tanto nacionais quanto internacionais foi um fator motivador para a adoção do Twitter.

A relevância do Twitter

Apesar disso, acho que o Twitter não é uma ferramenta de uso contínuo no Brasil. Acredito que a evasão ainda seja grande e que a grande maioria dos usuários ainda está em outros espaços. Na verdade, os dados do Ibope têm mostrado que o Facebook vem crescendo de forma mais consistente, já passando o Twitter e tornando-se o segundo SRS mais usado no Brasil. (E sim, acredito que muito em breve começarão as matérias mostrando o crescimento do Facebook diretamente relacionado, também, ao crescimento do uso dos aplicativos no Brasil, de forma especial, os jogos. ) O Twitter, para mim, ainda é uma ferramenta de nicho, que faz barulho porque seus usuários são influenciadores. Mas a grande massa dos internautas brasileiros não a adotou (e acho que nem vai adotar a curto prazo).

Algumas referências:

RECUERO, R; ZAGO, G. Em busca das "redes que importam": redes sociais e capital social no Twitter. Líbero (FACASPER), v. 12, n. 24, 2009.
RECUERO, R.; ZAGO, G. “RT, por favor”: considerações sobre a difusão de informações no Twitter." Revista Fronteiras, vol 12, n. 2, maio-agosto de 2010.
Posts passados sobre a pesquisa do Twitter: I, II, III e IV.
Texto meu no DML a respeito das práticas sociais do Twitter no Brasil (fev 2010)


Mais na lista da Gabriela Zago a respeito de microblogs.
por raquel (08:10) [comentar este post]


Comentários

Rodrigo Cunha (outubro 25, 2010 1:32 PM) disse:

Sou estudante de publicidade, e seus artigos e seu livro tiveram grande importância na elaboração do meu TCC.

Meu projeto é de uma rede social para jovens que empreendem. Muitas vezes a atual geração de jovens (geração Y) deixam de realizar as suas ideias por falta de um conhecimento específico ou qualquer outra ajuda. A rede social Meera viria promover esta troca, gerando mais ideias e colaboração, promovendo parcerias e estimulando o espírito empreendedor do jovem brasileiro.
O foco não está em empresas ou profissionais, mas sim em jovens que ainda estão descobrindo suas qualidades e sentem a necessidade de criar e fazer.

No momento em que mais se fala de mídias sociais, ouvi alguns comentários leigos e criticas sobre o meu projeto de TCC.
Fui muito questionado, e gostaria de saber a sua opinião, pois vejo que você é a pessoa mais apta para falar de rede social no Brasil.

- considerando que a maioria das redes sociais nacionais de nicho possuem menos de 10 mil usuários, não seria inadequado comparar uma pequena rede com as mais populares do mundo? O fato de ser pequena e atingir poucas pessoas tira o seu valor?

- muitos conhecem apenas as principais redes sociais do mundo. Mas quando pensamos no público brasileiro e em um target (neste caso jovens que empreendem), você acha besteira pensar em uma rede social de nicho? (lembrando que o intuito não é atingir milhões de acessos e usuários, mas sim estimular o jovem a realizar as suas ideias e fortalecer a cultura do empreendedorismo no país)

- Muitos usam as populares redes sociais da internet para buscar ajuda para um projeto. Diferente delas, que tem como intuito promover amizades, no meu projeto o objetivo é promover parcerias (independente da ajuda ou do projeto).
Você não acha que, se bem executado, este projeto poderia de fato contribuir com esta pequena parcela de pessoas que buscam parceiros para tirar as suas ideias do papel e colocá-las em prática?

- Sobre campanha publicitária na Internet. Na sua opinião é mais eficiente atingir milhões de pessoas em mídias de massa como TV (onde as pessoas não tem escolha, e apenas recebem a informação), ou atingir poucas pessoas em mídias sociais (onde o internauta tem o poder de escolha, diálogo, relacionamento)? Importa mais os números, ou a qualidade no contato?

- Uma das principais qualidades da Internet é a produção de conteúdo. Você vê importância em estimular o jovem a criar e a cocriar?

Diante de muitos questionamentos sobre o meu projeto de TCC (que é apenas um projeto), percebi que se eu desistisse dele abriria mão do que eu acredito e das principais ideologias do projeto (empreendedorismo, o valor de gerar conteúdo, compartilhar, colaborar, criar e fazer).
O empreendedorismo é um ato e é correr riscos, assim como a publicidade. Vejo que comigo o aprendizado vem com o desafio.

Raquel, se você se sentir à vontade para me esclarecer estas dúvidas, eu ficaria muito grato.
Mais uma vez agradeço, pois o seu conhecimento foi muito importante para o desenvolvimento do meu TCC.
Espero que me ajude.

Rodrigo Cunha.

Franklin Yamaçake (outubro 26, 2010 10:14 AM) disse:

Será que podemos considerar também os seguintes fatores:
- As pessoas supririam a carencia na qualidade dos serviços, postando desabafos/reclamações?
- ser o primeiro a retuitar uma noticia engraçada/em primeira mão é uma forma valiosa de conectarmos aos nossos amigos?
- substituição de mensagens SMS por Tweets?
São muitas reflexões...
ótimo post, trata-se da filosofia da sociedade moderna

Rodrigo (outubro 29, 2010 2:07 AM) disse:

Raquel,

Porque o Facebook não pegou no Brasil?

Faço essa pergunta, pois acho que o Orkut pegou no Brasil por estar vinculado ao Google e por ter sido traduzido para o português rapidamente. Nesse sentido, o Twitter ainda não tem uma versão em português, mas é simples de manusear inicialmente. De qualquer forma, deixo outra questão, desses 23% de internautas brasileiros que usam essa ferramenta, poucos usam mais de 50% das possibilidades, poucos sabem o que é um redutor de link ou tem noção da possibilidade de agregar a ferramenta com alguma outra (p.ex.: Twitpic); e acabam utilizando a ferramenta mais para se comunicar com amigos e expor questões do seu cotidiano, do que para buscar informação (links) por exemplo.

Abs.

raquel (outubro 29, 2010 8:15 AM) disse:

Oi Rodrigo!
Concordo. Já escrevi sobre isso aqui no blog. Há um ano atrás eu comentei que o Facebook representava um sério risco do Orkut no Brasil - http://www.pontomidia.com.br/raquel/arquivos/facebook_x_orkut_no_brasil_alguns_apontamentos.html e sobre os resultados de uma pesquisa a respeito da história do Orkut no Brasil - http://www.pontomidia.com.br/raquel/arquivos/recuperando_a_historia_do_orkut_no_brasil.html :)

Johnny Cantarelli (novembro 10, 2010 2:50 PM) disse:

Pessoal, achei o percentual um tanto exagerado e fui conferir o artigo da Time. 65% é o tráfego não-americano, vejam:
"But Twitter's international traffic now accounts for 65% of the website's overall content, with growing followings in Europe and Asia."

Luiz Alfredo (dezembro 22, 2010 5:34 PM) disse:

Acho as considerações sobre a ditadura no Brasil não tem nada a haver, a massa de usuários das redes são compostas por jovens que não passaram nem perto da ditadura...

O que faz sentido para mim é a busca de integração do jovem. No mundo virtual ele é "o cara" não precisa ter cultura, saber escrever corretamente, ter dinheiro, status...

E ter um milhão de "amigos" prá mostrar, é tudo de bão!

Mesmo que sejam só figurinhas no seu album.

Cordialmente.

L.A.

Comente este post